terça-feira, 5 de novembro de 2024

HÁ 102 UM MATRIMÔNIO QUE VIRIA A SE TRANFORMAR NUMA TRAGÉDIA.

 


A história da Maria de Bil – A Santa do povo varzealegrense.
 
1. A ORIGEM DE MARIA
 
A Saga de Maria de Bil se sustenta em provas históricas devidamente documentadas em livro e contadas em depoimentos de pessoas contemporâneas.
 
Em estudos mais aprofundados constata-se que por volta do ano de 1919, chegavam a Várzea Alegre, vindos do Estado de Alagoas, o casal Clementino Romeiro e Antônia, juntamente com seus três filhos: Severino, Maria e Madalena. Acredita-se que Romeiro não seja de fato o sobrenome de Clementino, que assim era chamado, acredita-se, porque era seguidor do Padre Cícero Romão Batista. Há quem diga, aliás, que Clementino Romeiro tenha vindo morar em Várzea Alegre seguindo orientação do próprio vigário. O seu objetivo em terras varzealegrenses, era trabalhar na construção do “grande açude de Várzea Alegre” – projeto inicial do atual açude Deputado Luiz Otacílio Correia (Olho D’água), cujas obras foram iniciadas na comunidade de Barragem, naquele mesmo ano, e suspensas no ano seguinte, 1920, ainda na fase da construção de suas fundações. Mesmo com a paralisação das obras, Clementino Romeiro já havia decidido continuar morando com sua família em Várzea Alegre, no Sítio Inharé, mais precisamente, onde era a casa de seu José Bitú Filho (Zé Bitú) e de Isabel Bastos Bitú (Dona Biluca), quando passaram, então, a ser moradores dos Fiúzas do Sítio Chico, sendo que plantavam também nas terras de Manoel Leandro Bezerra e de José Bitú Filho (Zé Bitú), no alto da Serra do Gravié.
 
2. A UNIÃO DE MARIA E BIL.
 
Maria era uma mulher simples. Casou-se com Bil, este oriundo da região de Iguatu, em 05 de novembro de 1922, na Igreja Matriz de São Raimundo Nonato. Aquele dia foi marcado pela realização de mais 25 matrimônios, entre os quais estão registrados, o de Joaquim de Sátiro, Joaquim Mandú, Zacarias de Biluca e Dica de Joaquim Bezerra, entre outros. Todos moravam na ribeira do Riacho do Machado e a celebração dos matrimônios foi realizada pelo padre José Alves de Lima.
 
3. O CASO EXTRACONJUGAL DE BIL E O FIM DO CASAMENTO.
 
O casal Maria e Bil continuou morando no sítio Inharé e ali nasceram dois filhos: Necília e José. Durante a sua terceira gravidez, Maria descobriu que sua irmã Madalena – que aparentemente tinha problemas visuais – mantinha um caso com Bil. Segundo contam, Bil pretendia fugir com Maria e deixar toda aquela confusão para trás. Entretanto, a esposa, magoada pela traição, recusava a proposta do marido e preferiu voltar a morar na casa dos pais.
 
4. A VINGANÇA DE BIL PELO DESPREZO DE MARIA.


Com o orgulho ferido por causa do desprezo da mulher, Bil passou a arquitetar a morte de Maria. Sabendo que esta levava a comida para os trabalhadores da roça de seu pai, Bil resolveu surpreendê-la numa emboscada na beira da estrada. E assim o fez. Em 11 de março de 1926, por volta das dez horas da manhã, quando Maria se dirigia à lavoura na companhia de duas amigas, uma delas, Francisca de Zé Chato, Bil apareceu de repente armado com uma faca. As companheiras de Maria fugiram e Bil, então, passou a esfaquear a esposa, atingindo-a com três golpes fatais. Segundo contam, o assassino teria comido parte de uma das panturrilhas da vítima, numa espécie de pacto com forças ocultas, para não ser encontrado nunca mais, fato este que se consumou.


5. A REPERCUSSÃO DA MORTE E O INÍCIO DA DEVOÇÃO.


O crime cruel revoltou toda a Várzea Alegre e causou grande comoção. Maria foi sepultada no Cemitério da Saudade, mas não é possível identificar o seu túmulo. Seu pai, Clementino Romeiro, para marcar o local do triste fim da sua filha, fixou uma cruz na estrada. A partir de então, as pessoas passaram a visitar o local e a rezar pela alma de Maria, além de pagar promessas e agradecer graças alcançadas, segundo dizem, pela sua intercessão. Depois de um tempo, o médium e curandeiro, Emídio Alves de Oliveira (Emídio da Charneca), levantou naquele mesmo local uma barraca coberta de telha. Já em 1954, o casal Ana Maria da Conceição e José Joaquim de Sousa, do Sítio Unha de Gato, que costumava trafegar por ali, colocaram na barraca um quadro com a imagem de Nossa Senhora de Fátima, mas este foi quebrado pelo gado que pastava pela serra.
No dia 20 de janeiro de 1957, após 31 anos da morte de Maria de Bil, foi construída uma capela no local, à época, nas terras pertencentes a Ignácio Gonçalves da Costa (Inacinho). Quem mandou construir a capela foi José Alves de Oliveira (Zé Pretinho), que colocou uma imagem de Nossa Senhora de Fátima no altar. Os pedreiros foram Expedito Vieira de Almeida (Expedito Beca) e Manoel Geraldo de Lima (Geraldo Miguel), enquanto o altar e o reboco foram feitos por Antônio de Souza Neto (Antônio de Maria).
Alguns fatos da construção da pequena capela são curiosos. Tomamos como exemplo o gesto dos agricultores da região, que para ajudar na construção, carregavam tijolos no bornal – ou “bornó” – como chamado na região, já que não existia estrada, mas apenas uma pequena vereda que dava acesso às roças na Serra do Gravié.
A bênção e a primeira missa na intenção de Maria na capela foram realizadas pelo padre José Otávio, no dia 30 de novembro de 1957. Ali ainda foi batizado Antônio Venâncio de Souza (Antônio de Chiquinho), do sítio Unha de Gato, sendo realizada também a primeira comunhão dos irmãos, Francisco das Chagas de Morais e Vicente Paulo da Costa.
Pelos relatos históricos, nas proximidades da capela de Maria de Bil, era costume dos pais enterrar recém-nascidos que faleciam, formando um “Cemitério de Anjos”. Outro fato interessante é que muitos estudantes passaram a “se apegar” com Maria de Bil para passar de ano, o que explica a quantidade de provas escolares encontradas na capela como ex-votos. Muitos políticos já subiram a serra pagando promessa pela vitória conquistada nas urnas. São incontáveis os números de doentes que já visitaram o local para agradecer a cura de doenças. Porém, quem mais visita a capela até hoje, são as mulheres sofredoras, que veem em Maria de Bil, uma protetora das aflitas e desesperadas.


6. O DESTINO DA FAMÍLIA DE MARIA DE BIL.


Após a morte de Maria, os seus filhos – José e Nercília, ficaram sob os cuidados dos avós, Clementino Romeiro e Antônia. José faleceu e Nercília se casou com Gabriel Firmino, da família “Gibão”. Desta união nasceram seis filhos – três homens (Antônio, Ademir e Elizeu) e três mulheres (Francinete, Tica e Aparecida) e residiram na Lagoa do Serrote. Faleceram em Várzea Alegre – Nercília, em 1958, de parto, e um de seus filhos, conhecido por Antônio. Os demais, juntamente com o pai, se mudaram para o estado do Pará.
Madalena, irmã de Maria, chegou a ficar grávida de Bil, mas a criança faleceu logo após o nascimento. Madalena ainda se casou com Zé de Severino, vindo a falecer no início dos anos de 1970, no povoado dos “Batalhões” em Várzea Alegre.
Severino, o irmão mais velho de Maria, antes da morte desta, já havia ido morar no estado de São Paulo, e dele não se teve mais notícias.
Não há registro da data exata da morte dos pais de Maria – Dona Antônia e Clementino Romeiro, mas sabe-se que ambos faleceram no início da década de 60 e foram sepultados no Cemitério da Saudade, em Várzea Alegre, mas ninguém sabe identificar as sepulturas.
Outras versões para o sumiço de Bil.


O sumiço do autor do crime fez surgir outras versões da história com traços folclóricos. Alguns acreditam que Bil tenha sido amaldiçoado e passou a transformar-se em lobisomem que chorava na mata, assustando as pessoas. Outra versão diz que para “virar lobisomem”, Bil teria que engolir sete homens, daí o pavor dos trabalhadores da região que temiam se tornar uma das vítimas. As moças tinham medo de passar por perto das moitas e serem agarradas por Bil, enquanto as crianças não saíam de casa durante a noite porque “Bil-Lobisomem pegava”.
Também há uma versão que aponta que Clementino Romeiro teria vingado a morte da filha, matando Bil, num crime sigiloso, fato conhecido por poucas pessoas, entre estas, Quinco Honório, que no dia do sepultamento de Clementino Romeiro teria revelado a vingança de Romeiro a Vicente Bezerra de Morais (Vicente Santiago), na época responsável pelo sepultamento do pai de Maria de Bil. Ainda hoje tem gente que teme a alma perversa de Bil, que segundo contam, é um vulto que aparece na serra com gemidos arrepiantes.
Maria de Bil – Um mito da Cultura Popular Varzealegrense
Um nome que não se apaga na nossa história.
Uma Maria que simboliza todas as Marias sofridas da vida.
Em 2005, no governo do então prefeito José Helder Máximo de Carvalho (Zé Helder), por meio da Secretaria de Cultura e Turismo, que tinha como secretário o advogado Hélio Batista, com o objetivo de fortalecer as tradições populares foi realizada a I Caminhada à Capela de Maria de Bil, no último domingo de março (27/03/2005), por ocasião do mês do seu falecimento. No percurso até o local da sua morte, foram colocadas sete cruzes, representando o sofrimento de Maria e sua triste história, e onde são rezados terços pelos caminhantes.
Em 07 de abril de 2013, o prefeito Vanderlei Freire, participando da IX Caminha à Capela de Maria de Bil, prometeu construir, na Serra do Gravié, próximo da capela, uma imagem do Cristo Ressuscitado, bem como investir em infraestrutura e no melhoramento do acesso ao local.  A partir da iniciativa do prefeito Vanderlei Freire, que contou com apoio dos amigos e empresários José Helder Máximo de Carvalho (Zé Helder) – que doou a base para edificação da estátua, Francisco Ferreira de Sousa (Sival Bilica) – doador do terreno onde a estátua foi erguida, e Carlos Kleber Pinheiro Correia – que fez a doação do sistema de iluminação, a estátua do Cristo Ressuscitado foi inaugurada no dia 30 de março de 2014, sob as bênçãos do Padre José Mota Mendes. A data coincide com o período da páscoa.
O prefeito Vanderlei Freire optou por construir a imagem do Cristo Ressuscitado por Jesus Cristo representar o maior símbolo do cristianismo.
A estátua do Cristo Ressuscitado foi projetada e construída pelo artista plástico cearense Adenildo Adriano Cavalcante, medindo 12 metros de altura e feita em fibra de vidro.
Fonte de Pesquisa:
Primeira Edição – Fevereiro de 2005, pela equipe técnica da Secretaria de Cultura e Turismo de Várzea Alegre.
Reedição – Marcos Filho, Francisco Evanildo e Nonato Alves, em 26 de março de 2014.
José Alves de Oliveira (Zé Pretinho), 93 anos, na época do crime com 15 anos. Maria Luiza do Carmo – 84 anos – esposa de Zé Pretinho – com quem teve 11 filhos.
Livro “O Ceará” – Raimundo Girão e Antônio Martins Filho, ano 1938.
Cúria Diocesana do Crato – Documento de Registro de Matrimônios realizados na Igreja Matriz de São Raimundo Nonato em 1922, cedido por e-mail, em 18 de março de 2014.
Vicente Bezerra de Morais (Vicente Santiago), em entrevista ao radialista Marcos Filho, no dia 24 de março de 2014.

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