Quadro de Pedro Américo retratando o grito de D. Pedro I — Foto: Divulgação/Museu Paulista |
A
independência do Brasil é celebrada em 7 de setembro, data em que Dom Pedro I,
então príncipe regente em 1822, deu seu famoso grito às margens do rio
Ipiranga, em São Paulo. Mais tarde, o momento foi retratado em diversas
pinturas e talvez a mais conhecida dela seja a obra "Independência ou
Morte", também conhecida como "O Grito do Ipiranga", de Pedro
Américo.
A
obra foi encomendada ao artista pelo governo de São Paulo em 1886 como uma
forma de homenagear o império brasileiro e foi entregue em 1888, um ano antes
da Proclamação da República.
Para
a historiadora Michelli Scapol Monteiro, que faz pós-doutorado no Museu
Paulista e é curadora adjunta da exposição "Uma História de Brasil",
da qual o quadro de Américo faz parte, a ideia da obra era criar uma imagem
idealizada do passado. Portanto, não se deve considerar o que é mostrado na
pintura como retrato fiel do fato em si.
"É
impossível interpretar qualquer pintura como um documento do passado no sentido
do evento que ela retrata. Ela diz muito mais sobre o momento em que ela foi
produzida. A pintura de história é sempre uma representação que nunca será o
passado", diz.
Especialmente
tratando-se de uma pintura feita sob encomenda com um único objetivo. "É
um quadro muito específico porque é para um espaço muito específico. Ele sabia
que ficaria exposto em um edifício que estava sendo construído para celebrar a
Independência. Então foi na intenção de celebrar o 7 de setembro em São Paulo
que ele cria esta obra", explica Michelli.
Quadro
‘Independência ou morte’, de Pedro Américo, tem 31 metros quadrados e é
destaque no Museu do Ipiranga
Américo
se dedicou para produzir o quadro, seguindo traços de artistas históricos da
época que recorriam a documentos para retratar o acontecimento de forma mais
realista.
"Pedro
Américo foi no local para estudar um pouco da geografia do espaço, procurou
retratos de pessoas que estiveram presentes naquele evento, estudou
indumentária para saber quais eram os uniformes da época" explica a
estudiosa.
Mas,
afinal, o que é e o que não é real na obra?
Os
elementos históricos estavam ali, representados especialmente por Dom Pedro e
pelo riacho do Ipiranga.
Fora
isso, outros aspectos foram "incrementados" pelo artista.
"Considerando
os registros de viagem de Dom Pedro na época, ele dificilmente estava viajando
acompanhado de tanta gente", opina a estudiosa.
No
quadro, além do príncipe regente, aparecem ao menos outras 44 pessoas. Apenas
quatro delas não eram oficiais.
Outra
coisa alterada pelo pintor durante a produção da obra foi a espécie dos
animais. Soldados, comitiva e civis são vistos montando cavalos. Mas, segundo a
historiadora, Dom Pedro e seus acompanhantes viajavam montados em burros.
"Américo
justificou em seus registros que a presença dos cavalos valorizaria o momento.
Além disso, seria difícil explicar para a aristocracia europeia, que veria o
quadro em primeira mão, o que eram aqueles animais que eles não
conheciam".
As
vestes oficiais usadas por Dom Pedro e pelos soldados também foram colocadas
ali para enaltecer o ato. "Imagina-se que a pequena comitiva que
acompanhava o príncipe regente vestia roupas confortáveis para viajar",
conta.
Pedro
Américo aparece na obra; ele estava lá?
Aproveitando-se
da liberdade criativa, Pedro Américo inseriu a si mesmo no quadro, fazendo
aparição como membro da comitiva real. Michelli destaca que Américo não esteve
presente no 7 de abril de 1822, afinal ele nasceu apenas duas décadas depois.
"Ele
fazia isso. Américo também aparece em outro quadro, na 'Batalha do Avaí', como
um dos combatentes. Então ele tinha isso de se auto-retratar", enfatiza.
No
fim das contas, o quadro foi aprovado e amplamente difundido. Tanto que, ainda
hoje, é uma das principais referências à Independência do Brasil em livros
didáticos.
Por
Emily Santos, g1 — São Paulo
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