Certa feita conversando com o nosso grande poeta Raimundo Lucas Bidinho, ele a mim falou que o Poeta Antonio Gonçalves da Silva(Patativa do Assaré), além de poeta era profeta. Eu indaguei o porquê, no que ele falou. Certa feita ia nós fazer uma cantoria em sitio da zona rural deste município quando o poeta Patativa avistou na beira da estrada um bem copado pé de juazeiro e disse poeta, quando chegar naquele pé de juazeiro eu vou fechar um cigarro. Chegando ao local referido, o poeta Bidinho acocorou-se ao pé da arvore, quando Patativa falou; "Eh nego réi, que rocê vai dar um vei mole". - "E hoje eu estou do jeito que Patativa falou; Véi e mole".
Fazendo jus as palavras do poeta Bidinho, vejo na poesia que se segue, Uma verdadeira visão futurista do momento atual.
Aposentadoria de Mané Riachão - Patativa do Assaré
lSeu moço, fique ciente
Do que eu vou lhe contá.
Sou um pobre pinitente
Nasci no dia do azá;
Por capricho eu vim ao
mundo
Perto d`um riacho fundo
No mais fei ingrutião.
E pruqui lá fui nacido,
Fiquei sendo cuincido
Seu Mané do Riachão.
Passei a vida penanu
No mais cruel padecê,
Cuma tratô trabaianu
Pro felizardo cumê.
A minha sorte é trucida,
Pra miorá mia vida
Já rezei e fiz premessa,
Mas isto tudo é tolice.
Uma cigana me disse
Que eu nasci foi de trevessa.
Sofrenu grande cansêra
Virei bola de biá.
Trabaiano nas carreira
Daqui pra ali e pra aculá,
Fui um eterno criado
Sempre fazeno mandado,
Ajudano os home rico.
Eu andei de grau em grau,
Tal e qual o pica-pau
Caçano broca em angico.
Sempre entrano pelo cano
E sem podê mais trabaiá,
Com sessenta e sete ano
Arrisuvi me apusentá.
Fui batê lá no escritóru,
Depois eu fui no cartóru
Porém de nada valeu.
Veja o que foi, cidadão,
Que aquele tabelião
Achou de falá pra eu.
Me dise aquele escrivão
Fringinu o couro da testa:
- Seu Mané do Riachão,
Eses seus papé num presta.
Isto aqui não vale nada,
Quem fez esta papelada
Era um cara vagabundo.
Pra fazê seu apusento,
Tem que trazê documento
Lá do começo do mundo.
E me disse que só dava
Pra fazê meu aposento
Com coisa que eu só achava
No Antigo Testamento.
Eu que tava prazenteiro
Mode arecebê dinheiro,
Me disse aquele escrivão
Que precisava dus nome
E também dus sobrinome
De Eva e seu marido Adão.
E além da indentidade
De Eva e seu marido Adão,
Nome da niversidade
Onde estudou Salumão.
Com outras coisa custosa,
Bem custosa e cabulosa,
Que neste mundo revela
As Escritura Sagrada:
Quatro dente da queixada
Que Sansão brigou com ela.
Com manobra e mais manobra
Peu pudê me apusentá,
Levá o nome da cobra
Que mandou Eva pecá.
E além de tanto fuxico,
O registu e o currico
De Nabucodonosô,
Dizê onde ele morreu,
Onde foi que ele nasceu
E aonde se batizô.
Veja moço, que caipora,
Veja que grande novela
E a pió de todas ela
O sinhô vai vê agora.
Para que eu me apusentasse,
Disse que também levasse
Terra de cada cratera
Dos vulcão do estrangeiro
E o nome do vaqueiro
Que amansou a Besta Fera.
Escutei achanu rim
Com a natureza fraca,
E ele oiano pra mim
Com os zóio de jararaca.
Disse: - A coisa aqui é
braba
É preciso que você saiba
Que eu aqui sou escrivão.
Ou essas coisa apresenta,
Ou você não se aposenta,
Seu Mané do Riachão.
Veja, moço, o grande
horrô,
Sei que vou morrê
depressa,
Bem que a cigana falou
Que eu nasci foi de trevessa.
Cheio de nicissidade,
Vou vivê de caridade.
Uma esmola, cidadão!
Lhe peço no Santo nome,
Não deixe morrê de fome,
Seu Mané do Riachão.
Autor: Patativa do Assaré
Titulo: Aposentadoria de Mané Riachão